Vaticano

Martínez-Brocal: "A rapidez com que reproduziram declarações descontextualizadas do Papa causou mal-entendidos".

Javier Martínez-Brocal, um veterano vaticanista, faz um balanço do estilo de comunicação do Papa Francisco nesta entrevista.

Javier García Herrería-24 de abril de 2025-Tempo de leitura: 3 acta
Brocal

Javier Martínez-Brocal é um veterano vaticanista que acompanhou de perto o pontificado de Francisco. Como jornalista, dedicou grande parte da sua carreira a fazer reportagens sobre o Vaticano e a Igreja Católica. Foi diretor de Relatórios de Romauma das principais agências noticiosas sobre o Papa e a Santa Sé, e o seu trabalho tem sido fundamental para levar a informação religiosa ao público com uma abordagem clara e acessível.

Nesta entrevista, Martínez-Brocal dá a Omnes a sua opinião sobre o papel do jornalismo na Santa Sé e como vê a evolução da comunicação no Vaticano num mundo cada vez mais interligado.

Da sua experiência como correspondente no Vaticano, quais são as principais diferenças na comunicação do Papa Francisco em relação aos seus antecessores?

Tenho a impressão de que Francisco quis mostrar que o Papa não é uma autoridade distante. Um dos fios condutores do Pontificado é a proximidade, também na comunicação. O Papa deu dezenas de entrevistas. 

O Papa optou por uma relação mais direta com os jornalistas, sem depender tanto da Sala de Imprensa. Que impacto teve isso na cobertura mediática do Vaticano?

Do ponto de vista do Dicastério para a Comunicação, imagino que não tenha sido muito fácil, porque o Papa confiava muito no seu instinto e quase nunca pedia conselhos ao Dicastério para a Comunicação sobre as suas relações com a imprensa. Com os media, o impacto foi enorme. É uma forma de dizer que ele não se importava de responder a perguntas diretas, que não tinha medo de ser responsável pelas suas decisões. 

Como é que este novo modelo de comunicação alterou a forma como os media interpretam e transmitem as mensagens papais?

A proximidade do Papa é já uma mensagem muito forte e permite que o ponto de partida seja positivo. Este desejo de diálogo é entendido pelos meios de comunicação social como abertura e permite abordar questões complexas e negativas de uma forma construtiva. 

Na era das redes sociais e do acesso imediato à informação, que desafios e oportunidades apresenta este estilo de Francisco mais espontâneo e acessível?

A rapidez com que as redes sociais reproduziram declarações descontextualizadas do Papa deu origem a mal-entendidos e mal-entendidos. Penso que isto envenenou a perceção de Francisco nalgumas ocasiões, mas a médio prazo beneficiou os meios de comunicação especializados, pois gerou uma maior curiosidade e uma maior procura de compreensão dos códigos que utiliza.

Nas suas viagens apostólicas, Francisco faz frequentemente declarações no avião que geram manchetes globais. Estas conferências de imprensa ajudaram a compreender o Papa ou geraram interpretações ambíguas?

Estas conferências de imprensa tiveram mais vantagens do que desvantagens, foram muito úteis. Permitiram-lhe explicar-se, mostraram como a Igreja tem uma atitude construtiva. E lembro-me que, quando cometeu erros ou utilizou expressões coloridas, pediu sempre desculpa. 

As viagens de Francisco têm dado prioridade às periferias geográficas e existenciais, como o Iraque ou o Sudão do Sul. O que destacaria das suas impressões sobre as viagens de Francisco?

Resta-me o seu interesse em ir onde ninguém queria ir, em chamar a atenção para países e situações que passam despercebidos no jogo global de interesses: Albânia, Papua Nova Guiné, Timor-Leste... Fiquei tocado por esta delicadeza. 

Considera que as viagens de Francisco redefiniram a diplomacia do Vaticano e o seu papel nos conflitos internacionais?

Não sei... Penso que ajudaram a compreender melhor as prioridades do Papa enquanto líder religioso, que eram diferentes das que teria se fosse apenas um líder político.

Francisco escreveu mais de 40 livros Este nível de produção tornou a sua voz mais influente? 

É necessário distinguir as compilações das suas homilias e discursos que foram publicadas como livros seus, daquelas que ele realmente levou a cabo como projeto editorial, que são poucas. Estas são geralmente muito valiosas e foram bem recebidas. 

Acha que o Papa tem sido demasiado exposto nos meios de comunicação social?

Na cena mundial, é sem dúvida uma das vozes mais interessantes e independentes e talvez a que mais contribuiu para travar as crises que atualmente nos pesam. Alguns teriam preferido que ele falasse menos, talvez por estarem ressentidos com o que ele disse. 

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